A cientista brasileira MariaÂla Hungria foi laureada com o prêmio mundial de alimentação que é considerado o Nobel da agricultura. Essa premiação, ela é concedida às pessoas que ajudaram a melhorar a qualidade, a quantidade ou a disponibilidade de alimentos do mundo. Para falar sobre essa conquista da ciência brasileira, que é extremamente importante, nós vamos conversar então com a própria Mariângela, que é pesquisadora da Embrapa e faz parte então da diretoria da Academia Brasileira de Ciências. Boa noite pra senhora. Boa noite, Rafael. Boa noite, Renata. Boa noite todo mundo que tá assistindo. Magia Ângela, primeiramente uma ótima noite mais uma vez. É um prazer recebê-la aqui. Parabéns pelo prêmio. Eu li uma frase sua que eu achei interessantíssima, dizendo que estar num palco como esse, depois de tanto trabalho e de tanto desenvolvimento, é uma chance de mostrar que o Brasil não é só devastação. Ao longo da sua carreira, você fala sobre a importância da sustentabilidade sobre a utilização de produtos biológicos, inclusive na agricultura comercial. Eu queria aproveitar muito aqui a nossa entrevista para falar um pouco do seu trabalho, entender de fato a importância, o simbolismo que tem um prêmio como esse. Então, eu acho que, na verdade, o prêmio foi dado por eh um uma carreira de de vida, persistência, nunca ter desviado 1 mm daquilo que eu acreditava, porque é engraçado isso de vocação, né? Quando era criança, já com 8 anos, eu li um livro de vida de microbiologista e decidi que eu ia ser microbiologista, mas eu queria produzir alimentos. Me chocava muito ver as pessoas que passavam fome. Então eu fui paraa agricultura, fui fazer agronomia, né, na época era uma profissão bastante masculina, machista e eu ainda querendo estudar biológicos, né? Era uma época, 45 anos, que só se pensava que agricultura de porte, de grande produção, tinha que usar muito químico. E eu pensava: "Não, não é assim. Eu acredito nos biológicos, eu tinha estudado lá sobre o poder dos microrganismos e persisti, não foi fácil. Na época ninguém acreditava nisso. Eu podia ter seguido caminhos mais eh fáceis de emprego, eh de dinheiro para pesquisa, mas eu nunca nunca desviei. Por dentro de mim eu sempre tinha certeza. Mas qual era a certeza? Eu não queria assim uma biológica, tipo, só para ortinha lá de casa, uma agricultura orgânica, uma agricultura familiar extremamente importante, mas eu tinha certeza que os microrganismos podiam ser úteis para todo tipo de agricultura, do pequeno ao grande. E esse que foi o nosso diferencial. Eu nunca trabalhei com a ideia de eh não, tudo bem, a gente salva o planeta, mas tem que produzir menos. Não, a minha ideia era não, eu vou ter que me virar para achar uma solução científica para que ele possa ter alta produção, mas substituindo, no meu caso, os fertilizantes químicos, né, parcial ou totalmente da maior maneira possível. Então, eu acho que foi essa coerência em 40 anos de pesquisa que acabou levando esse diferencial que deu esse prêmio. Olha, eu jamais podia imaginar, né? Imagina aqui no interior do Paraná, eh, com pesquisa no Brasil que o dinheiro é assim, sabe? Eh, ganhar o prêmio mundial, que é o Nobel da agricultura. Então, inacreditável, ainda não caiu a ficha. MariaÂngela, parabéns aí pelo prêmio. Eh, pra gente poder entender a importância da sua descoberta, como a substituição desses fertilizantes químicos pelos biológicos, como essa substituição pode contribuir pra produção de alimentos, para impactar menos o ambiente e também para trazer mais economia? Olha, eu vou falar uma coisa que é a total verdade. Hoje a gente é o maior produtor exportador de soja do mundo, né? Se não fossem nossos microrganismos, nós não seríamos. Por a soja, o valor da soja é justamente pelo alto teor de proteína que a soja tem. E proteína é nitrogênio, então a soja precisa muito nitrogênio. E o nitrogênio fertilizante ele é muito caro. Nós importamos 85% do nitrogênio fertilizante que a gente usa pago em dólar. Então, se a gente tivesse que usar fertilizante nitrogenado para produzir o que hoje a gente produz, considerando área, rendimento, isso, nós íamos ter que gastar nessa última safra, a estimativa era 25 bilhões de dólares, imagina. Então, seria totalmente eh inviável economicamente. Então, falo sem dúvida nenhuma, não seríamos produtores de soja se não fosse esse nitrogênio, porque não seria viável economicamente. Agora, o outro lado, o lado que realmente me orgulha muito de trabalhar com isso, com o uso dos microrganismos, a gente tá contribuindo pra saúde do solo, tá? Então a gente vê uma proliferação de vida no solo e a gente tá deixando de poluir rios reservatórios de água, porque quando você lixvia muito nitrogênio, daquela proliferação de plantas que consome oxigênio, você tem até a morte dos peixes. E também e eh o nitrogênio fertilizante, ele é o que mais contribui paraa emissão de gases de efeito estufa de todos os fertilizantes. 1 kg de N equivale a 10 kg. Então, só no caso da soja, usando as bactérias, a gente tá deixando de emitir 236 milhões de toneladas de CO2 equivalente. Então, já imaginou economia pro país, pro agricultor que tem um baita lucro usando esses microrganismos, melhorando a saúde do solo, ainda evitando emissão de gases de efeito estufa. Então, o que que eu fico muito contente também de ter eh recebido esse prêmio, não sou eu, entende? tempo, é a minha instituição, a Embrapa, que sempre acreditou eh nessas pesquisas e me permitiu fazer essas pesquisas, o Brasil e levar essa imagem. Nós temos às vezes uma imagem muito negativa lá fora, não. Olha aqui, ó, aquela que ganhou o prêmio fala que o país é altamente sustentável. Nós temos problemas de vários agricultores. Nós temos, mas olha, eu trabalho com pequeno agricultor até o grande. Posso te falar que a grande maioria dos dos agricultores brasileiros acredita em sustentabilidade, usa biológicos, tenta fazer tudo da melhor maneira possível. Então vamos, acho que é uma oportunidade de mostrar essa vitrine e eu quero fazer inveja mesmo, tá? quando for lá receber em outubro nos Estados Unidos de olha como o meu país é sustentável. Nós somos os líderes mundiais no uso de biológicos na agricultura e dos benefícios que eles dão. Como que pode um país não ser sustentável e ser o líder do uso de biológicos? Então eu acho que vai ajudar um pouco na imagem do Brasil também. MariaÂngela, muito obrigado por vir aqui conversar conosco. Foi um prazer recebê-la, entender um pouco da sua trajetória e a gente vai estar aqui acompanhando de perto, torcendo para que venham outros prêmios. Muito obrigado por falar conosco, tá? E eu que agradeço a oportunidade de poder falar aqui, tá bom? Até mais. Uma boa noite. Tchau.
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